(48) 3242-0530 | artecon@artecon.cnt.br Siga-nos nas redes sociais:

O CONTROLE DE LEGALIDADE DO IBS

Home / Notícias / Tributário / O CONTROLE DE LEGALIDADE DO IBS
Publicada em 26 de Julho de 2024
Você já pensou como ficará sua vida se no futuro, por um lapso, esquecer de pagar o IBS?
 
Não adianta tentar pensar em outra coisa. Se você mora no Brasil, tem um mínimo interesse por política e cuida do seu bolso, só falou em reforma tributária nos últimos dias.
 
E tem tanta coisa nova, que podemos passar os próximos anos falando disso. São dúvidas, inconsistências e necessidade de aprimoramentos…
 
Mas você já pensou como vai ficar a sua vida se, lá no futuro, por um lapso, esquecer de pagar o IBS? Quem vai cobrar essa conta?
 
As regrinhas de cobrança estão no PLP 108/2024, que, entre outras coisas, institui o Comitê Gestor do IBS e dispõe sobre o processo administrativo tributário desse imposto. Está lá escrito que a fiscalização e a cobrança administrativa serão coordenadas pelo Comitê Gestor, mas quem vai pôr a mão na massa e realizar as atividades serão os estados e os municípios (art. 2º, § 1º, VI).
 
Já o contencioso administrativo será decidido pelos estados e municípios através do Comitê Gestor do IBS (art. 101), o que é extremamente positivo, por assegurar uma maior uniformidade nas decisões administrativas.
 
Mas e depois? Nos casos em que o contribuinte discutiu na esfera administrativa e foi mantida a cobrança tributária do IBS, como segue?
 
Se a gente for lembrar lá das aulas de direito tributário, depois que o lançamento se torna definitivo (ou seja, depois de encerrada a discussão na esfera administrativa), o crédito deve ser inscrito em dívida ativa, para seguir seu caminho de cobrança forçada.
 
E aqui é sempre bom pensar sobre o que significa essa "inscrição em dívida ativa": ela é "ato de controle administrativo da legalidade", segundo o art. 2º, § 3º, da Lei de Execuções Fiscais. Ou seja, é o momento em que um agente público vai lá e controla a atuação de outro agente público, para verificar se ele agiu de acordo com a lei.
 
Na maior parte dos estados brasileiros, a inscrição em dívida ativa é ato de competência privativa dos procuradores. São eles que fazem essa última checagem da legalidade do lançamento tributário, antes de cobrá-lo (em juízo ou extrajudicialmente). E não é nenhuma surpresa que essa atribuição seja dos advogados públicos: nos termos do art. 132 da Constituição, eles são os responsáveis por interpretar a lei e dar orientação jurídica. Logo, dão essa orientação sobre cobrar ou não o tributo.
 
Faz sentido, né?
 
Mas não é isso o que está previsto no PLP 108/2024.
 
Nesse projeto, foram "preservadas" as competências dos estados e municípios. Na prática, o legislador ficou com medo de mudar o status quo, e decidiu que naqueles estados e municípios em que o controle de legalidade é exercido pela advocacia pública - como deve ser, à luz das diretrizes constitucionais - continua-se fazendo dessa forma. Mas naqueles estados e municípios em que a inscrição não é feita pela advocacia pública… É, continua não sendo feito.
 
Ruim, né? Controle de legalidade exercido por alguém que não é advogado… Soa estranho… Alô, OAB!
 
Mas nossos problemas não acabaram: sob a ótica do contribuinte (aquele que, lá no início desse texto, por um lapso, não pagou o IBS), isso gera complexidade. Se ele deixar de pagar o IBS devido ao estado de São Paulo, por exemplo, a inscrição será feita pela Procuradoria-Geral do Estado, e todo o processo de negociação para pagamento será realizado lá.
 
Mas, se ele deixar de pagar para o Rio Grande do Sul, a inscrição em dívida será feita pela Secretaria da Fazenda, e talvez ele negocie com a Sefaz, mas talvez tenha que ir na PGE. Depende da vontade do auditor fiscal de mandar ou não o processo para o jurídico… De acordo com o art. 2º, § 4º, do PLP 108, ele tem longínquos 12 meses para mandar o processo para a PGE…
 
Não está nada bom.
 
E é por isso que a Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape), juntamente com o Colégio Nacional de Procuradores-Gerais dos Estados e do Distrito Federal (Conpeg), elaboraram proposta de emenda ao PLP 108, propondo exatamente que a inscrição em dívida ativa, como ato de controle de legalidade que é, seja de competência dos advogados públicos.
 
Sempre vale lembrar que um dos princípios dessa reforma é a simplicidade (art. 145, § 3º, da Constituição), e que ficar mandando o contribuinte de um lado para o outro, por medo de alterar o status quo, não está alinhado com o espírito da reforma.
 
Por: Melissa Castello, Procuradora do Estado do Rio Grande do Sul, presidente da Fundação Escola Superior de Direito Tributário (FESDT), integrante do PAT-RTC, professora da PUC-RS, doutora em Direito pela PUC-RS, mestre em Direito pela Universidade de Oxford. Autora do livro "Um novo IVA - Os tributos sobre o consumo e a economia digital"
 
Fonte: JOTA.
Fonte de publicação: ITC Net

Compartilhe esta notícia nas nas redes sociais: